Terapia como testemunho

novembro 2022

Fazer terapia é uma escolha consciente por algo que você não sabe onde vai dar. Sim, é um passo de ousadia, ou de risco ou de extrema necessidade e urgência. Pode ser uma escolha planejada, pode ser uma escolha que surge como uma coincidência ou uma surpresa, pode ser uma escolha de muitas tentativas (e alguns desencontros). Eminentemente é uma escolha – quero fazer terapia, ainda que seu marido ou sua esposa tenha lhe sugerido, ainda que alguém tenha lhe indicado, você diz para si mesmo: “agora é, vou ligar, vou marcar, vou fazer”. Daí, você acha a linha terapêutica de sua escolha (ou ainda que não saiba qual é, se familiariza com a opinião dos amigos ou lê sobre), você procura o terapeuta, agenda e faz sua sessão. O que acontece do momento em que você pensa na ideia até o momento que você termina a sessão? E o que acontece quando você agenda mais uma? Ou escreve seu feedback sobre como foi a sessão primeira para o terapeuta? O que te leva a continuar a fazer terapia, passada a primeira arrebentação?

Lua Perê, astróloga e monitora da Formação em Astrologia do Método Luz e Sombra de Cláudia Lisboa, com quem tenho tido um pouco contato mas tão profundo – do qual sou tão grata – fala que, na astrologia, procuramos testemunhos. Achei uma palavra linda e uma ideia extremamente interessante para falar de terapia. De como entendo BodyTalk, como entendo Constelações e como tenho me entendido com a Astrologia, as abordagens das quais atuo como terapeuta – são  tempos de experiência distintos nas três mas condenso aqui minha atuação profissional como observadora, paciente, mediadora e terapeuta integrativa sistêmica.  

A ideia de testemunho é sem dúvida algo tão revelador e óbvio que poucos talvez se apercebam. Sabemos que eticamente o terapeuta não é um aconselhador (adoro os vídeos que Selon Melo posta sobre a série Sessão de Terapia em que comenta notadamente qual lugar e papel do terapeuta, ou ainda alguns de humor pois quebram com o gelo de que “terapia a gente faz no bar” ou que “terapia é coisa de gente “louca”” (viu quantas aspas!)), nem tão pouco fazer terapia precisa ser sobre uma questão, embora sempre haja uma questão, mas pode ser também sobre uma qualidade de alma, de viver, de estar. Por isso, a ideia de testemunho me parece tão rica: além de viver, você vai testemunhar sua vida, sua história, seu jeito de olhar para as situações, conflituosas ou mais aprazíveis. 

Testemunhar é estar ali na hora que acontece. Quantas vezes você está no momento presente quando sua vida transcorre? Ou quando vê o dia já acabou? A relação já acabou? Já foi demitido? Quem você amava, morreu? Aquela oportunidade passou? Você envelheceu? Adoeceu? Acidentou-se? Perdeu? Gastou? Ou passou da hora e agora você “corre atrás”? Olha só como a ideia de testemunho passa tão longe se não tivermos atentos ao tempo da vida: o tempo do testemunhar. 

Lá, na astrologia, a função mesmo do astrólogo seria perseguir os momentos e chaves de conexão em vários níveis do mapa em que o testemunho se faz: vai acabar, vai perder, vai findar, vai passar ou esteja atento a um aspecto que colide, transgride, salta, multiplica, expande, cura, amolece, endurece, cutuca, convida com ou em algum lugar da sua vida. A justaposição tão complexa e linda, quase matemática com filosofia, mostra que signos (do ponto de vista semiótico) fazem transpassar signos (do zodíaco, energias), planetas, casas e aspectos, do seu nascimento, do seu presente e do seu futuro. O tempo é comprimido em possibilidades de você realmente testemunhar sua vida. Estar ali, presente, quando nasceu, no que viver o no que vivenciará ainda. Está pronto para isso?

Pois é, a terapia – e então eu, Nirvana, entendo que BodyTalk, Constelações e Astrologia são espaços de terapia, de testemunho, de observar para equilibrar, ainda que em temporalidade e intensidades distintas – é um espaço de presença. Para testemunhar, você precisa (re)aprender a estar presente, a ver e observar com atenção, e tornar consciente suas formas de expressão. Então, inevitavelmente, confrontar as vezes em que estava ausente, desatento, perdido, cego, iludido ou simplesmente você estava vivendo as várias dimensões que a vida tem. A do erro, inclusive. Ou engano, ou equívoco, se você quiser. Também podemos testemunhar os momentos de falha – como em matriz, quando quem vinha a tela de algoritmos, identificava algo “de errado”.  Testemunhar não tem juízo de valor – é sempre bom. Testemunhar é. 

Achei que essa reflexão vem a contento para trazer ideias, como as do ensaio anterior, que vem permeando meu olhar atento – e testemunhal – às práticas interativas com as quais atuo. Também dá um sentido novo ao BodyTalk e às Constelações, assim como me inaugura no campo da Astrologia (me sinto já conhecida nessa festa, mas também novata atenta aos detalhes). Testemunho a consciência. É isso que faço todos os dias com meus pacientes, clientes, humanos e animais, individualmente ou em grupo, estudando e pesquisando, meditando e sentindo. Terapia é testemunho na medida em que não pára nunca, se torna a própria vida. Viver na presença é ter uma relação de amor com o testemunho. Sempre é novo e também conhecido. Sempre é surpreendente e também bem evidente. Sempre estar por vir e já estava lá. É uma fresta de abertura para viver na consciência. Testemunhe você. Sou prova viva do seu viver.

Nirvana Marinho

novembro 2023

com votos de um lindo fim de ano para você 

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